Os pirilampos e Taliesin



“olhos que nunca se molham nada vêem quando olham…” – Afonso Lopes Vieira

Adormeci com os olhos molhados – Taliesin; sonhei com os edificios que nascem com a paisagem, acordei com a alma entranhada dessa beleza, enquanto da boca me saía “Viva, viva  los locos que inventaron el Amor” de Pizzolla.
A culpa foi de um pequeno livrinho preto que já tantas vezes me passou pela mãos, mas que me comove sempre de novo, as palavras de Távora, que devolvem até nos dias mais sombrios a esperança de uma arquitectura inteira e viva.
“E o mundo sente, todos nós sentimos (e eu chorei por isso mesmo) que me falta qualquer coisa, que a máquina está perturbada, que o caminho não é exactamente este e que os anos passam…” – passam, passam e vamos ficando cansados perante tanta frivolidade, automatismo e genocídio do belo.
Enquanto Távora me falava de Wright, de vida, de lembranças, de terra e de valores voltei aos Alpes, para encontrar um fim de tarde de verão, um caminho de terra batida que se encaminha para o bosque e pirilampos. 
Porque os grandes Homens e a boa arquitectura possuem o poder de reavivar memórias e de nos transportar para os dias em o universo se movia em perfeito balanço. Mas Taliesin, pela mão do mestre Távora fez muito mais que isso. Devolveu-me aos dias em que a arquitectura me era bela, idealista, roda motriz e âncora. Pegou-me pela mão para uma visita guiada através de todas as imagens e vivências que ajudaram a semente a criar raízes e a fixar-se ao solo. 
Não estou ainda em mim, mas reconheço-me sobre uma luz diferente, talvez a mesma chuva brilhante da encosta no Douro, das folhas douradas de Outono na ponte de madeira, no calor da terra vermelha, na paz do manto branco de cada Natal.
A paixão de um mestre devolveu-me à arquitectura, que por sua vez me devolveu ao lar, o meu lugar e este fez renascer o Sonho.
Hoje mais que nunca sei que as obras e os Homens que me tocam possuem algo que lhes é transversal, a carência, a saudade, e é essa falta que dita a direcção – sei-o porque também o sinto “brilha a beleza que provém da carência” (Zumthor)