Eu sou antes, eu sou quase, eu sou nunca

lost dreams. Casa do Conto. Susana dos Santos
“E eis que em breve nos separaremos
E a verdade espantada é que eu sempre estive só de ti e não sabia
Eu agora sei, eu sou só
Eu e minha liberdade que não sei usar
Mas, eu assumo a minha solidão
Sou só, e tenho que viver uma certa glória íntima e silenciosa
Guardo teu nome em segredo
Preciso de segredos para viver
E eis que depois de uma tarde de quem sou eu
E de acordar a uma hora da madrugada em desespero
Eis que as três horas da madrugada, acordei e me encontrei
Fui ao encontro de mim, calma, alegre, plenitude sem fulminação
Simplesmente eu sou eu, e você é você
É lindo, é vasto, vai durar
Eu não sei muito bem o que vou fazer em seguida
Mas, por enquanto, olha pra mim e me ama
Não, tu olhas pra ti e te amas
É o que está certo
Eu sou antes, eu sou quase, eu sou nunca
E tudo isso ganhei ao deixar de te amar
Escuta! Eu te deixo ser… Deixa-me ser!” 
Clarice Lispector

While Away

Giardini della Biennale di Venezia
Sou nómada; mas carrego na alma o peso de todos os livros que li, de todas as paisagens que admirei, de todos os sorrisos que recebi, de todas as lágrimas que chorei.
“(…) E tudo isso, que é tanto, é pouco para o que eu quero.” 
– Álvaro de Campos
Agora que se encerra mais uma etapa e outra paisagem se ergue no horizonte, deixo algumas memórias por Lisboa.
O projecto While Away feito para / por quem ama a aventura, reunirá fragmentos de vida capturados pelas objectivas de muitos amantes do desconhecido.
Em exposição a partir de 6 Maio no LX Factory.

Umquotidiano

Dog Days

Dor? Alegria? Só é simplesmente questão de opinião. Eu adivinho coisas que não têm nome e que talvez nunca terão. É. Eu sinto o que me será sempre inacessível. É. Mas eu sei tudo. Tudo o que sei sem propriamente saber não tem sinónimo no mundo da fala mas enriquece e me justifica. Embora a palavra eu a perdi porque tentei falá-la. E saber-tudo-sem saber é um perpétuo esquecimento que vem e vai como as ondas do mar que avançam e recuam na areia da praia. Civilizar minha vida é expulsar-me de mim. Civilizar minha existência a mais profunda seria tentar expulsar a minha natureza e a supernatureza. Tudo isso no entanto não fala de meu possível significado. 

O que me mata é o quotidiano. Eu queria só excepções. Estou perdida: eu não tenho hábitos.  


Clarice Lispector, in ‘Um Sopro de Vida’ 

Check out more about the project: https://instagram.com/p/BEY9SEEGjM0/

To visit until 14 June at Av. Espaço Montepio / Porto. Portugal

Notes for an Epilogue

Notes for an Epilogue. Tamas Dezso 

Se me impedirem de olhar o horizonte, 
de todos os pontos cardeais, 
se este for substituído por muros, que nos dizem que não somos iguais,
voltar-me-ei para o céu,
na esperança de me unir com o cosmos
Quando também isso me for privado e houverem barreiras ao azul,
que me gritam que também sou diferente,
voltar-me-ei para o terra,
ao fitar o pó fundir-me-ei com o chão e seremos um.
Quando tudo for amarras, serei pó,
pó do universo
Sem vozes que me roubem a /de casa,
sem guilhotinas que me torturem o espírito.

Amittere humanismus

“Some things that should not have been forgotten were lost. History became legend. Legend became myth.


Dresden – Richard Peter



Chegamos aqui, a encruzilhada da nossa Era.

Perdemos o respeito por aqueles que criaram a democracia, esquecemos o valor da palavra Humanidade, é-nos alheio o respeito pela Vida.
Em quanto uns pilham desesperados, outros dão-lhes um bilhete de volta para o inferno e alguns deixam que o infernum seja num descampado qualquer aqui ao lado. Berra-se por barreiras, por fronteiras, por latas de tinta vermelha e grita-se com aqueles que por miséria própria, ou talvez por misericórdia, não deixam afundar no mar o grito que lhes dá a costa.
Estamos cegos, de superioridade fútil, de ignorância demagoga, de medo com cheiro nauseabundo a cobardia.
O que nos torna mais dignos e humanos que os outros? As regras, nas quais sucumbimos e azedamos? Os recursos, dos quais decretamos ser donos e senhores? A moral, a estratificação social do verbo subjugar?
O mundo bateu-nos a porta, depois de viver décadas na miséria, está a pedir o que lhes é de direito – a Vida!
E o mundo que já não bate, mas derruba a porta, está inflamado em ódio, está com a alma doente. Chamamos-lhe bárbaros, aqueles que chegam no limbo já com sede de sangue. Também outros, dos nossos, homens do 1ºmundo, chegam das guerras para as quais os mandam, ou desejam ir, ou nem sabem que vão, doentes desse mesmo mal. Esses são igualmente ignorados, poucos são tratados, mas a doença tem nome e não desaparece por encanto. É cruel o que faz, são grutescas as suas manifestações, mas tem nome – trauma de guerra!
Ódio não se vence com desprezo, nem com mais ódio, a antítese do ódio é o amor.
O nosso modo de vida perdeu a data de validade, mas o motivo não são os tiroteios nas cidades do mundo civilizado, foi porque o mundo dito civilizado pisou, maltratou e usou o resto ( Homens, animais, planeta) para seu belo prazer.
Em nome do status quo, estamos hoje disposto a vender a nossa liberdade e ser vigiados por Alguém (alguém conhece esse alguém?), a queimar nas ruas os direitos humanos conquistados com o sangue de tantos, demasiados, durante séculos. Prontos para aromatizar a alma com raiva e travar a grande guerra, aquela que vem depois de todas as outras. Insuflar Egos, proclamar reis, marchar!
!(…) Darkness crept back into the forests of the world.”